Vidas Passadas: O Simples em sua forma mais pura

Vidas Passadas: O Simples em sua forma mais pura

29 Janeiro, 2024 0 Por Murilo Fagundes

Sucesso desde meados de 2023, “Vidas Passadas”, filme da produtora A24, marca o primeiro longa-metragem da diretora sul-coreana-canadense Celine Song, que além da direção, também assina o roteiro da obra.

“Nora e Hae Sung, duas amigas de infância profundamente conectadas, se separam após uma mudança. Duas décadas depois, elas se reencontram na cidade de Nova York para uma semana fatídica, enquanto confrontam noções de destino, amor e escolhas.”

Com uma sinopse que parece remeter ao clichê romântico do reencontro do amor da infância, o filme vai desconstruindo ao longo da trama, mostrando sentimentos de forma pura dentro de uma dualidade de universos. Celine Song, assim como Nora, imigrou para o Canadá e também é dramaturga. Não sabemos o quanto de sua vida está impresso no roteiro, mas percebemos algo pessoal ali que podemos admirar pela proximidade. Esse talvez seja o maior destaque de Vidas Passadas: seu roteiro, a desconstrução do romance sem descartar os sentimentos, e a forma como ele cuida de cada personagem. Nora imigra para outro país e se encontra lá, Hae Sung guarda durante anos o sentimento por sua amiga de infância, e até mesmo Arthur, marido de Nora, entende que faz parte da vida dela no presente, mas que existe uma Na Young que ele jamais conhecerá ou fará parte.

Esses sentimentos permeiam o filme sem trazer aquela melancolia pedante, cativando o espectador por se sentir tão próximo dos personagens. Você passa o filme torcendo por eles, para no final, assim como eles, entender que não existe a possibilidade de ficarem juntos, por uma série de questões que vão além dos sentimentos presentes.

A direção de Celine é simples, mas não é maneirista; é singela, lembrando muito o cinema de Hong Sang-Soo. Uma direção contemplativa, com movimentos de câmera que se encontram com os personagens, funcionando muito bem aqui. A direção sabe o que faz, conhece a história que está contando e sabe como contá-la da melhor forma possível. A fotografia também é contemplativa, prendendo-se aos mundos dos personagens e funcionando muito bem com a montagem proposta. Planos transitam entre os personagens, mostrando as singularidades de cada um, e depois os colocam no mesmo plano, mostrando por que eles funcionam tão bem juntos.

As atuações são ótimas, os atores interpretam todas as nuances. Enquanto Greta Lee incorpora essa personagem que passou por mudanças e se encontrou, mas ainda pensa no que poderia ter perdido ou em encontrar algo que nem sabe se realmente perdeu, Teo Yoo tem uma certa tristeza no olhar que só desaparece quando finalmente reencontra o amor de sua vida, mas entende que eles não podem ficar juntos. John Magaro, por sua vez, chega mais despercebido no início como o marido que beira a insegurança, mas entende que existiu uma Nora antes dele e que ele respeita isso.

Vidas Passadas é simples, e é isso que o torna tão belo. Celine tinha domínio da história e não tenta fazer algo extraordinário, mas despretensiosamente beira o extraordinário, não pela grandiosidade da direção ou por uma fotografia impecável, mas pelo simples ato de contar e mostrar sentimentos.

Vidas Passadas já estreou nos cinemas brasileiros e o filme conta com indicações ao Oscar 2024, incluindo “Melhor Filme” e “Melhor Roteiro Original.